Ingra Morales Claro, Ester Sabino e Nuno R. Faria, Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina, Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP, São Paulo, Brasil), do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo (Brasil), da Universidade de Edimburgo, da Universidade de Birmingham, do Imperial College de Londres e da Universidade Oxford, Reino Unido, relatam um genoma quase completo do primeiro caso confirmado de varíola dos macacos detectado no Brasil, coletado em 7 de junho de 2022 no Instituto de Doenças Infecciosas Emilio Ribas, de um paciente do sexo masculino de 41 anos e com histórico de viagem recente para Portugal e Espanha. O artigo Shotgun metagenomic sequencing of the first monkeypox virus case from Brazil, 2022 foi publicado na Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, vol. 64.
O vírus da varíola dos macacos (MPXV) é um vírus zoonótico de DNA de dupla fita, com genoma de 197 kb, membro do gênero Orthopoxvirus (OPV) e da família Poxviridae, que também inclui o vírus da varíola que causa a doença de mesmo nome. A classificação genômica é dividida em 2 clados, referidos como o clado “Oeste africano” e o clado “Central africano” ou “Bacia do Congo”. No entanto, uma nova classificação proposta muito recentemente dividiu o MPXV em 3 clados distintos (1-3). O clado 3 contém a maioria dos genomas dos surtos humanos de 2017 a 2022, com sua diversidade denotada por linhagens neutras, como A a B.1 (Happi, et al., 2022).
O MPXV foi identificado pela primeira vez em um menino de 9 meses de idade, em 1970, na República Democrática do Congo e, desde então, tem sido responsável por causar vários surtos de varíola dos macacos relatados no continente africano (Bunge, et al. 2022). No início de maio de 2022, foram detectados casos de MPXV no Reino Unido e em Portugal, a maioria sem histórico conhecido de viagem para países endêmicos.
Até 9 de junho de 2022, 1.240 casos foram confirmados em 33 países de todos os continentes, a maioria deles em países europeus e nos Estados Unidos, com dois casos de MPXV da América do Sul, notificados da Argentina e 8 suspeitas de infecções por varíola nos estados brasileiros de Santa Catarina, Ceará, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Rondônia e São Paulo.
Ao sequenciar por abordagem shotgun metagenômica, usando a tecnologia Nanopore o swab de pele das lesões (vesícula e crosta) do caso suspeito, pesquisadores do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, Brasil, identificaram 3 SNPs únicos no primeiro caso de genoma de MPXV do Brasil, quando comparado ao genoma do CDC atualizado dos EUA. Eles mostraram que o primeiro caso de MPXV do Brasil agrupou-se dentro da linhagem B.1 recentemente proposta (Happi, et al, 2022), e estava intimamente relacionado com as sequências de Portugal, Alemanha, EUA e Espanha.
Eles também avaliaram se os primers de diagnósticos RT-qPCR recomendados eram adequados para a identificação do genoma do vírus recém-sequenciado investigando incompatibilidades presumidas nos sítios de ligação de primers e sondas para os conjuntos de detecção de MPXV genérico e B.1 MPXV específico. A análise mostrou que é improvável que as mutações encontradas afetem a sensibilidade deste conjunto de primers, indicando que os primers existentes podem detectar infecções do surto atual.
Temos agora mais de 4.000 casos de MPXV confirmados em 47 países, e o Brasil já registrou 14 casos confirmados, três deles autóctones. Os autores ressaltam que este estudo destaca a importância da confirmação do diagnóstico por meio de uma técnica de sequenciamento rápida e confiável e da vigilância genômica do MPXV para melhor compreensão da epidemiologia, padrões de transmissão, evolução do vírus e sua adaptação à transmissão humana, e avaliação de métodos de diagnóstico laboratorial.